terça-feira, 29 de setembro de 2009

Fora da ordem

Veja só. Vanessa foi minha primeira namorada séria, depois dos casinhos fortuitos do colégio. Foi lá que nos conhecemos, passamos dois anos juntos e chegamos a morar aqui neste apartamento que agora divido com o Felipe por seis meses antes de ela decidir voltar para casa. Não houve nenhuma briga, nenhum rompimento entre nós, chegamos a cogitar a continuidade do namoro a distância, mas ela própria abortou a ideia.

Veja só. Essa mesma pessoa -- tão querida, tão próxima, com uma história inacabada ao seu lado -- recebe um email meu com o endereço deste blog e a sugestão de leitura. Mas eis que, ao decidir comentar, ela o faz no post do meu colega, e de uma maneira impessoal, como se quem estivesse aqui, abrindo as entranhas em público, fosse um casinho fortuito do colégio. E era.

-- Você viu que a Vanessa nos tratou da mesma forma?

-- O quê? Como assim? –- perguntou Felipe.

-- ‘Meninos’, ela nos chamou de ‘meninos’.

-- E o que isso quer dizer?

-- Que, para ela, nós dois estamos no mesmo nível. Eu, o namorado com quem até pouco tempo atrás ela dividia apartamento, e você… Espere, você conhecia a Vanessa?

-- Eu? Não, quer dizer, da escola. Nós éramos da mesma classe, um ano atrás de você. E, estudando juntos, a gente, assim, se conheceu.

-- Sei, então vocês trocaram umas bitocas nessa época…

-- É.

Veja só. Foi uma pergunta retórica, em tom de ironia. Eu não esperava uma confirmação. Não, eu jamais esperaria que a Vanessa pudesse ser capaz de ficar com alguém como o Felipe. Ele se esforçou em explicar que tudo aconteceu antes, os dois eram próximos, ele a ajudava em algumas lições, Vanessa era conhecida por ser fraca nas matérias exatas.

-- Vai ver ela ficou com pena de mim, na época.

Eu não concordei na hora, mas só pode ser isso. Eu não via explicação mais convincente. Veja, Felipe é um cara legal, mas nada interessante, ou pelo menos não é o tipo de cara que arranca suspiros das mulheres, digamos assim. Pena, só pode ser, só pode ser…

sábado, 19 de setembro de 2009

O blog

Design de Games! Quantas vezes vou ter de repetir, Zé? Mas deixa pra lá. Você escreveu tanto que esqueceu de dizer como chegamos ao nome do blog. Eu me lembro como se fosse hoje do seu discurso, até por que foi só há duas semanas.

- A gente precisa de algo que nos una e represente a nossa personalidade

- Tem razão, mas como fazer isso se não temos nada em comum?

O Zé nem se lembrava de mim, mas estudamos juntos no ensino médio, em classes diferentes. Ele era o cara mais requisitado da escola, com aquele cabelão comprido e sempre com o violão debaixo do braço. A mulherada pagava um pau, não é mesmo? Eu nunca tive esse apelo, na verdade estou aqui em São Paulo para aprender com ele como se faz…

Pensei até em batizar o blog com o nome da nossa escola, mas ele detestou. O problema é que não tenho muita paciência pras coisas que ele gosta. Eu dormi de babar no dia em que ele alugou aquele filme do cara no deserto, qual era mesmo? Era pra ser o nome do blog, mas desta vez fui eu quem disse não.

Acho que foi só no dia em que botei aquela música do Radiohead que estava no meu MP3 pra rolar no note que a ficha caiu.

- Que tal “Aliens Subterrâneos”?

Ele ficou quieto, o que eu entendi como uma aprovação. Depois de procurar aqui no blogspot e ver que o nome não estava registrado, criei nossos perfis e o leiaute, sempre com ele do lado, dando pitacos e dizendo coisas do tipo: “não vai parecer ridículo?”.

Eu não estou nem um pouco preocupado, Zé. Ridículo ou não, tenho certeza que vai ser divertido.

quinta-feira, 17 de setembro de 2009

O começo e o fim

Faz quase dois meses que Felipe veio morar em casa. Posso dizer que a imagem daquele moleque desengonçado que bateu na porta de em casa com uma mochila nas costas e um laptop debaixo do braço me assombra até hoje.

Foi surpreendente vê-lo são e salvo na minha frente, e com aquele objeto precioso e constante alvo de ladrões à mão. Para dizer a verdade, até torci para ele se ser assaltado, sequestrado quiçá, traumatizar-se com a cidade grande e voltar para a nossa querida e distante Bauru.

A ideia do blog conjunto foi dele, uma maneira de contarmos aquilo que jamais teríamos coragem de dizer na frente do outro, como o parágrafo acima. Ele criou o design e o endereço, mas fiz questão de que o primeiro post fosse meu, para não espantar potenciais leitores.

Estou me acostumando à ideia de escrever aqui. Sei que perder parte do meu tempo no blog me desvia dos grandes planos, de trabalhar nas verdadeiras ideias. Mas, como disse Felipe, pode ser uma forma de treino, de qualquer maneira. Quem sabe essa história não vira um filme qualquer dia?

Tenho um raciocínio meio complexo, coisa de quem é artista por natureza, talvez. Meu nome é José e tenho 20 anos. Estou em São Paulo há quase um ano para estudar cinema, minha maior paixão depois que Vanessa, minha ex, resolveu voltar para Bauru.

Tínhamos planos ambiciosos: montar uma produtora nesse pequeno apartamento que alugamos e fazermos filmes juntos, dirigidos e escritos a quatro mãos. Um dia, porém, ela resolveu voltar para casa. Foi uma decisão súbita: não havíamos brigado (nós nunca brigamos) e vivíamos uma deliciosa lua de mel, sozinhos e longe de nossos pais.

Foi difícil me recuperar. Enquanto padecia emocionalmente, as contas não paravam de chegar, e sem a grana que os pais de Vanessa mandavam não dava para me sustentar.

Estava quase desistindo e voltando para casa quando minha mãe me disse que um garoto, filho de uma amiga lá em Bauru, vinha para São Paulo estudar computação (na verdade, design de computador, ou algo do tipo).

Foi assim que Felipe passou a ocupar o sofá da sala e a produtora de cinema se transformou em um blog de internet. Bem, não deixa de ser um começo, não é mesmo?